Incentivo online


Cadastro para a Lei Rouanet, desde janeiro, pode ser feito pela internet, mas novo sistema acumula dúvidas e críticas.

Carlos Minuano, para o Cultura e Mercado

A recente mudança no sistema de cadastro da Lei Rouanet, que agora é informatizado, acaba de completar um mês. Para fazer uma avaliação do novo sistema, Cultura e Mercado procurou algumas empresas do setor cultural que utilizam o apoio da lei de incentivo para captação de recursos. Desde o início de 2009, as propostas podem ser encaminhadas pela internet. O objetivo, segundo o Ministério da Cultura (MinC), é dar maior transparência ao processo, permitindo o acompanhamento e o monitoramento da concessão do benefício. Mas, o novo sistema já acumula dúvidas e críticas.

Em São Paulo, ao menos entre os grandes proponentes, o uso da nova ferramenta parece ainda não ter decolado. Entre as sete empresas procuradas pela reportagem, apenas uma já havia utilizado o sistema informatizado, a Divina Comédia, agência de produção e assessoria de comunicação nas áreas de arte e entretenimento, que já produziu uma série de eventos gratuitos com recursos obtidos pela Lei Rouanet. Telefonica Trio Tons, Pão Music e Festival Claro Curtas são alguns exemplos. “Até o momento a avaliação é positiva”, diz Sergio Ajzemberg, diretor da empresa. “O cadastramento foi simples e tivemos resposta em menos de 24 horas sobre um documento que faltava”.

Apesar da utilização ainda em pequena escala, superou a expectativa e o limite de espaço a quantidade de produtores e proponentes presentes em debate sobre o cadastro informatizado para a Lei Rouanet, promovido em meados de janeiro pela representação regional do MinC, na Cinemateca em São Paulo. Para a equipe de produtores da Móbile Cultural, empresa que ainda não utilizou o novo sistema, mas que esteve presente no encontro, o evento deveria ser realizado durante vários dias para atender todos os proponentes interessados. “O local estava lotado, a capacidade era de 200 lugares, mas tinha quase o dobro de pessoas”.

Na ocasião, o MinC apresentou os mecanismos de preenchimento dos projetos e procurou esclarecer as dúvidas dos participantes. Segundo os produtores da Móbile Cultural, o sistema ainda apresentava falhas e precisava de ajustes em vários pontos. “Não achamos positivo um sistema entrar em vigor ainda incompleto, sendo que o antigo (a inscrição via protocolo nas secretarias regionais) já não é mais aceito”.

A Móbile Cultural realizou em 2008, com incentivo da Lei Rouanet, a exposição “Bossa’ 50″, da Rádio Eldorado, no Pavilhão da Bienal de São Paulo, no Parque do Ibirapuera. Com entrada gratuita, a mostra recebeu a visita de mais de 35 mil pessoas.

Test Drive

Na página do MinC, um usuário entrevistado, identificado como o primeiro a utilizar o novo sistema, elogia a mudança para envio de propostas. Entretanto, logo em seguida, dezenas de comentários criticam e apontam falhas no formulário eletrônico. A reclamação que mais se repete aponta problemas nas planilhas, como falta de campos de preenchimento nas áreas orçamentária, administrativa, de recolhimento, entre outras.

Outros problemas recorrentes entre os usuários do novo sistema são falta de itens importantes, que impossibilitam o envio da proposta, a lentidão no sistema e a falta de atendimento por e-mail ou telefone. Questionado sobre o volume de cadastros pelo sistema, chamado de Salicweb, a regional do MinC em São Paulo afirmou não ter acesso aos números. A equipe da Secretaria de Fomento e Incentivo do MinC, em Brasília, responsável pelo cadastro online, também não foi localizada até o fechamento desta reportagem.

Vale lembrar que, além do encaminhamento eletrônico, continua válido o envio de propostas por meio dos Correios. Neste caso, segundo o MinC, o novo formulário deverá ser preenchido e encaminhado junto com a documentação solicitada.

Cultura e Mercado procurou outros cinco proponentes que captam recursos pela lei de incentivo. Por meio de suas assessorias de imprensa, a Bienal de São Paulo e o Museu de Arte Moderna de São Paulo (MAM-SP) optaram por não se manifestar e informaram não ter feito ainda nenhum cadastramento da Lei Rouanet por meio do novo sistema implantado. A empresa de produção cultural Base7 informou apenas que já se cadastrou, mas que até o momento não havia utilizado para envio de propostas. As ONG’s ImageMágica e Doutores da Alegria também foram procurados, mas não atenderam a reportagem.

Nesta quinta-feira, 5, foi realizado um videochat na página do MinC, em mais uma iniciativa para esclarecimento de dúvidas. Um vídeo com as respostas de Evaristo Nunes, da Secretaria de Fomento e Incentivo à Cultura do MinC, está disponível no site do ministério. Nunes informou durante o encontro virtual que eventos presenciais para explicar o funcionamento do cadastro informatizado, como o que ocorreu em São Paulo, serão realizados em outros estados.

Na próxima quarta-feira,11, é a vez do Rio de Janeiro, o evento será no Palácio Capanema, na Funarte, às 14h. Em seguida, de acordo com agenda da equipe divulgada no chat, serão Pernambuco, Bahia e Belém. “Queremos ampliar os canais do MinC com os proponentes”, observou Nunes. Porém, o atendimento aos usuários permanece pelo e-mail informe.sefic@cultura.gov.br. Sobre a demora nas respostas, Nunes explicou que “nem sempre é feito no mesmo dia, porque algumas questões são mais complexas que outras”.

Reforma da lei

Neste ano, o debate sobre as mudanças na lei Rouanet entram na reta final. O governo pretende levar ao Congresso, em fevereiro, um projeto de lei com novas regras e critérios para a renúncia fiscal. O tema ganha novos contornos com a crise econômica. Neste ano, por exemplo, o volume de recursos captados por meio da Lei Rouanet deve sofrer redução. Estimativas apontam cifras em torno de R$ 700 milhões, devido ao encolhimento dos lucros de grandes empresas. Número que deve arrepiar os cabelos de muito produtor cultural e acirrar a disputa pelos recursos. Em 2008, foram R$ 974 milhões arrecadados por meio da lei federal de incentivo.

Sergio Ajzemberg, da Divina Comédia, que acompanha o debate em torno da reforma da lei, defende a importância do incentivo federal para formalizar o setor cultural. “Ela foi responsável por um aumento significativo da empregabilidade na área de entretenimento”. Atualmente, cerca de 5.000 empresas utilizam o Programa Nacional de Apoio à Cultura (Pronac). Mas para um melhor desempenho do setor cultural, o produtor concorda que são necessárias mudanças importantes. “Além da atenção às diferenças regionais, é preciso destravar a burocracia e colocar mais profissionais no processo produtivo”, diz.

Comentários

Carlos Minuano disse…
A assessoria de comunicação do Ministério da Cultura (MInC), em Brasília, citando a matéria “Incentivo online”, entrou em contato por e-mail reclamando não ter sido procurada pela reportagem. Alega que o texto induz o leitor a uma interpretação equivocada de que o MinC não quis comentar o caso e solicita retificação da informação. Não creio que seja o caso de correção, porque o texto apenas conta o caminho tomado pela reportagem em busca de fontes.
(…) sobre o volume de cadastros pelo sistema, chamado de Salicweb, a regional do MinC em São Paulo afirmou não ter acesso aos números. A equipe da Secretaria de Fomento e Incentivo do MinC, em Brasília, responsável pelo cadastro online, também não foi localizada até o fechamento desta reportagem (…)
A matéria em questão não afirma, ou sugere, que o MinC não quis comentar o caso. Durante o fechamento, procurei a assessoria de imprensa da regional do MinC em São Paulo, onde foi realizado um encontro sobre o novo sistema de cadastro informatizado para a Lei Rouanet. Na ocasião, fui encaminhado a um assessor, que pensei ser de imprensa, chamado Guilherme, que me orientou a falar com o Evaristo Nunes, da Secretaria de Fomento e Incentivo do MinC. Não consegui falar com ele até o fechamento da matéria.
Não são poucos os casos em que solicitações de entrevistas e informações não são atendidas a tempo, seja por prazos apertados ou pela natureza da pauta, mais complexa ou polêmica. Vale destacar que não estou me referindo aqui ao MinC especificamente. Portanto, pular algumas etapas, muitas vezes excessivamente burocráticas, se torna em certos casos o caminho possível. Mas para desfazer qualquer equívoco de interpretação e ampliar o debate acerca do tema em pauta, foi encaminhada a assessoria de comunicação do MinC uma solicitação de entrevista com o secretário de Fomento e Incentivo à Cultura, Roberto Nascimento.

Carlos Minuano

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